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Paulo Sampaio

Para clientes de churrascarias cinco estrelas, carne podre é 'balela'

Paulo Sampaio

22/03/2017 04h01

À saída de uma churrascaria na região dos Jardins, em São Paulo, na última terça-feira (21), o superintendente executivo da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores de Produtos Industrializados, Oscar Attisano, diz que não teve medo de ingerir carne podre "porque tudo isso é uma balela". Ele acredita que, ao desencadear a Operação Carne Fraca, que afastou 33 servidores do Ministério da Agricultura, a Polícia Federal fez um alarde que não correspondia aos fatos. "Das 2.800 empresas auditadas, só 3 apresentaram problemas", acredita.  O blog visitou cinco churrascarias famosas da cidade, para saber se seus frequentadores estavam acompanhando o noticiário. Com a credencial  de "representante de uma entidade setorial", Attisano garante que o segmento de frigorífico vai bem: "É moderno, eficiente, lucrativo." E como então surgiu a "balela"? "Na família tem gente que não presta, na igreja tem gente que não presta, na política tem gente que não presta."

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Podres poderes
Em relação a esses últimos, ele mistura a carne podre com a "corrupção no governo de esquerda". Pelo que se divulgou, de fato a podridão estaria na relação promíscua entre políticos, fiscais e empresários do setor. Mas não só no governo de esquerda. No atual também, com envolvimento de ministro. "O [presidente Michel] Temer não pode derrubar o Renan, o César Maia (sic) e todos os outros porque senão derrubam ele." No entender do superintendente executivo da Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores de Produtos Industrializados, o presidente "tem de ir convivendo com os malandros". "Aos poucos tudo volta ao seu lugar."

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Corte de carne servido em churrascaria nos Jardins, em São Paulo. (Foto: Luisa Dorr/Folhapress)

 

"Fazenda própria"
Duas quadras abaixo, ao deixar outra churrascaria, o diretor comercial carioca Rodrigo Guedes diz que a fraldinha estava deliciosa: "Eles têm fazenda própria", garante.  Guedes não soube informar se eles também têm fiscais próprios.

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Pós-verdade
Em uma steakhouse no centro, um grupo de universitários conversa alegremente,  alheio à "carne fraca".  Luiz Gabriel Begattini Gaspari, que está com a namorada, Flavia Curci, parece apaziguar seu estômago com a informação de que não come carne de porco e que vai pedir a batata estilo "baked" sem bacon. Por sua vez, Flávia acha que "nem todas as carnes vêm do mesmo lugar". "Tem muita informação na mídia. Precisa ver o que é verdade, o que não." Enquanto isso, ela pede uma costela de porco. A duas mesas deles, o gerente de compras Thiago Jordão diz que não parou "para pensar a fundo no assunto" (da carne).

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O que não mata…
Em uma das mais tradicionais churrascarias de São Paulo, mal dá tempo de falar com  um senhor que entrega seu Porsche branco ao rapaz do valet – antes disso, o gerente aparece na porta e prontamente se apresenta. "Nossas carnes vêm do Uruguai e da Argentina", diz .  Ao lado dele, uma destemida senhora diz que não corre risco de intoxicação porque é frequentadora antiga do local.  Isso poderia gerar uma preocupação até maior, mas, ao contrário, ela encara como um sintoma de imunidade ao papelão: "O que não mata, fortalece."

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.