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Paulo Sampaio

No Iguatemi em SP, público diz que greve é obra de Lula e que "paulista é de trabalhar"

Paulo Sampaio

29/04/2017 10h17

Sentada em um banco do Shopping Iguatemi, no Itaim, zona oeste de São Paulo, a administradora de empresas Scheyla Frediani, 44, parece se divertir olhando para o visor do celular. Ela explica que postaram "uma coisa que eu concordo plenamente". E o que seria? "Colocaram lá que os grevistas tentaram impedir a entrada do João Dória na prefeitura, de manhã, mas chegaram tarde. E o prefeito disse: 'Da próxima vez, cheguem mais cedo, seus vagabundos'."

Na verdade, não foi bem assim. Em entrevista exclusiva ao Jornal da Manhã, da Jovem Pan, ao ser questionado sobre manifestações marcadas para ocorrer em frente a sua casa, e se ele foi incomodado, Dória respondeu: "Eu acordo cedo e trabalho. Eu não sou grevista que dorme, é preguiçoso e acorda tarde. Eu não sou Jaiminho, não. Se quiserem bloquear minha saída [de casa], acordem mais cedo."

Scheyla Frediani é contra a greve, que ela considera "a última instância, como a gente fez no 'Fora Dilma"' (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

O Iguatemi é um shopping em uma das regiões mais chiques da cidade. O blog circulou nesta sexta-feira por seus corredores, a fim de saber como a paralisação geral tinha afetado essa parcela da população. Depois de abordar cerca de vinte pessoas, descobriu que a maioria não sofreu impacto nenhum. Ainda assim, todas se declararam contra a paralisação.

"Manifestação tinha que ser no domingo"

Para Scheyla, "greve é a última instância". "Acho válido em casos extremos, como a gente fez no 'Fora Dilma"', exemplifica.  "Mas, naquele dia, ninguém atrapalhou o direito de ir e vir das pessoas. Por que essa gente não faz manifestação no domingo, como nós fizemos?" Na opinião dela, no fundo, "tudo é culpa do Lula". "Ele é um chantagista emocional. Sou contra o PT! E olha, pra mim, essa greve foi paga!" No entendimento da administradora, "os grevistas estão confundindo reforma trabalhista com a previdenciária". "Pode ver, os mais revoltados são os sindicatos, que vão perder a contribuição obrigatória. É a CUT, o MST, o PT.."

Scheyla afirma que ajudou a eleger João Dória, está satisfeita com o governo do prefeito e, se o pleito para presidente fosse hoje, daria seu voto para ele de novo. "O Dória é um homem culto, que tem conhecimento do que fala. Ele não precisa se preparar para uma entrevista. Se a CBS (rede de TV norte-americana) chegasse de repente aqui para entrevistá-lo, ele saberia responder em inglês. Não precisaria de tradutor, entende?"

"O paulista é de trabalhar"

O engenheiro civil e dono de imobiliária Orlando Gonçalves, 82 anos, diz que não foi particularmente afetado pela paralização, mas acredita que é um atraso para a cidade ficar quatro dias seguidos sem produzir. Baseado na generalização, o engenheiro compara: "O paulista é de trabalhar! Talvez para os cariocas seja bom ficar quatro dias sem trabalhar." Ele é paulista e liberou seus funcionários às 16h, porque "esse fim de mês é um período meio morto".

O engenheiro Osvaldo Gonçalvez, com a mulher, acha que a greve "é um movimento dos pelegos dos sindicatos" (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Orlando considera a greve "absurda". "É um movimento dos pelegos dos sindicatos. Mas graças a Deus essa mamata do imposto sindical obrigatório vai acabar!"

"Vamos, Orlando", diz a mulher dele, Neide, 72. "Desculpe, moço, é que eu preciso cuidar da minha cachorrinha. Mas pode colocar aí: nós achamos essa greve o fim!"

"O povo não lê. Prefere novelas" 

No corredor paralelo, caminhando a passos rápidos, está o industrial Guido Guillier, 55, para quem "o governo tomou as medidas corretas". "Só acho que deveria parcelar: primeiro fazer a reforma da previdência e, depois de um tempo, tirar o imposto sindical. Daria menos barulho."

O industrial Guido Guillier acha que "o povo no Brasil é levado por pensamentos errados porque não é esclarecido, não lê: prefere ver novelas"(Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Guido discorda do argumento dos grevistas, de que quem acaba pagando o prejuízo é a parcela mais desfavorecida da população: "O povo às vezes não entende, é levado por pensamentos errados. (Abaixando a voz) O povo no Brasil não é esclarecido. Não lê. Prefere ver novelas."

O estrangeiro que tenta entender o Brasil

Em frente ao Empório Armani, uma frequentadora diz oscilar entre ser a favor e contra a greve. "Discordo da maneira como é feita", diz a corretora de seguros Isabel Walker, 58. "Você viu que colocaram fogo em um ônibus?" Ela acredita, porém, que não sabe muito para opinar a respeito da paralização. "Preciso ler mais sobre o assunto."

Já o seu marido, o empresário australiano Simon Walker, 57, que fala português com sotaque e reconhece que não sabe muito sobre a história política do Brasil, não tem dúvidas: "Sou contra." O motivo de discordar da greve é um só: "Sou mais de direita", diz ele, fazendo o movimento correspondente com a mão.

E então, começa uma comparação entre Brasil e Austrália, onde o casal morou por muitos anos. "Aqui, é tão caro demitir um funcionário que ninguém quer mais admitir. Contrata como pessoa jurídica", diz Isabel.  Na Austrália, completa Walker, "é dificílimo despedir alguém": "Você tem de provar que fez tudo o que podia para manter o funcionário na empresa"…

…Até que ambos percebem que não faz muito sentido comparar duas realidades completamente distintas, ou fazer a relação entre partes do todo. Felizes da vida, eles são voltam a olhar as vitrines.

O australiano Simon Walker (com a mulher, Isabel) é contra a greve porque se considera "de direita"(Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.