Amigos rezam e cantam por Rogéria em missa de sétimo dia
Cerca de cem pessoas estiveram ontem na missa de 7º dia de Rogéria, celebrada às 18h30 na paróquia Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, zona sul do Rio. A artista morreu na noite de segunda-feira passada, aos 74 anos, em consequência de uma infecção generalizada. Estava internada há pouco mais de um mês em um hospital na Barra da Tijuca, zona oeste.
Rezada por Jorge Luís Neves Pereira da Silva, o padre Jorjão, a missa teve a duração de uma hora e reuniu amigos feitos desde o começo da carreira de Astolfo Barroso Pinto, nome de batismo do "ator transformista", como Rogéria se definia.
"Ela sempre foi uma presença tão forte que a gente nem notou essa parte da doença. Pra nós, ela era imortal", diz Roberta Close, que a conheceu quando ambas faziam a cobertura do Carnaval pela TV Bandeirantes. "Colega de trabalho como ela não existe. Passava a bola maravilhosamente."
Muito antes de tornar-se figura imprescindível nos bailes de carnaval cariocas dos anos 1980, fazendo entrevistas impagáveis para a TV, Rogéria já era uma personalidade consagrada. E não apenas pelos espetáculos gays, incluindo as produções de Carlos Machado e também de similares na Europa, na África e no Oriente. Ela foi jurada do programa do Chacrinha, um hit dos 1970 e 1980; interpretou a si mesma no cinema e fez teatro.
Em 1976, em parceria com Agildo Ribeiro, montou a hilariante Alta Rotatividade. Três anos mais tarde, recebeu o prestigioso Prêmio Mambembe por sua atuação no espetáculo O Desembestado, em que interpretava uma rezadeira casada com Grande Otelo. Com o show Gay Fantasy, de 1982, dirigido por Bibi Ferreira, ela ficou um ano em cartaz. Recentemente, participou da montagem brasileira de 7, O Musical, produzida por Charles Möeller e Cláudio Botelho. E cantou com Chico Caruso e Luiz Carlos Miele no divertido Homenagem à Trois.
Entre outros, foram homenagear Rogéria ontem as atrizes Maitê Proença, Cissa Guimarães, Carmem Verônica e Iris Bruzzi; a astróloga Leiloca; as transformistas Jane de Castro, Valéria e Isabelita dos Patins ("desmontada"). "Eu a conheci ainda de menininho, no camarim da TV Rio, quando ela era maquiadora", conta Carmem Verônica. "Eu e a Consuelo (Leandro, atriz) só nos tratávamos por 'bicha'. Era bicha pra cá, bicha pra lá. Então, já viu né? O Astolfo logo se enturmou com a gente."
A transformista Valéria, que conheceu Rogéria no início dos anos 60, diz que a amiga estava assistindo ultimamente a série "Feud", estrelada pelas atrizes americanas Susan Sarandon e Jessica Lange. As duas encarnam as rivais Bette Davis e Joan Crawford nos bastidores do filme "O que Teria Acontecido a Baby Jane?" (Robert Aldrich/1962): "Ela era louca pela Bette. Já estava no quinto capítulo", afirma Valéria. A transformista foi colega de Rogéria no show Les Girls, revista de travestis apresentada nos anos 1960.
Muito emocionada, Valéria conta que da última vez em que esteve no hospital, para visitar a amiga, as duas cantaram "Lobo Mau", de Ronaldo Bôscoli: Era uma vez um lobo mau/ Que resolveu jantar alguém/ Estava sem vintém, mas arriscou/ E logo se estrepou/ Um Chapeuzinho de maiô/ Ouviu buzina e não parou.
A atriz Terezinha Sodré, ex-mulher do capitão da Seleção Brasileira de 1970, Carlos Alberto Torres, diz que Rogéria vivia na casa deles. "Ela adorava futebol. Sabia os escretes de todos os times. A gente morava em uma coberturinha, e ali mesmo ele se pendurava fazendo shows só pra gente. O Carlos Alberto adorava ela", lembra.
Um retrato pintado de Rogéria foi colocado no altar. No começo da missa, o maestro Carlos Garcia tocou no órgão o clássico "Jesus, Alegria dos Homens", de Johann Sebastian Bach. Ao fim, amigos cantores a homenagearam e foram muito aplaudidos. Marcio Gomes cantou a "Ave Maria"; Eliana Pittman, "La Vie en Rose"; e Vitoria Virtus, "Eu Sei que Vou te Amar".
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