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Paulo Sampaio

Mulher esconde do marido que vai à terapia sexual tântrica e tem orgasmos

Paulo Sampaio

10/07/2019 04h00

 

Lívia, Marília e Camila: depois da terapia, orgasmos nunca antes imaginados (Foto: Iwi Onodera/UOL)

As quatro mulheres entrevistadas neste post pediram para ter suas identidades resguardadas. Três enfrentavam questões no relacionamento sexual "doméstico", quando resolveram experimentar a terapia tântrica. Trata-se de uma massagem feita com toques leves dos dedos, a partir da periferia do corpo, em direção ao sexo. A paciente deve estar nua. As quatro afirmam que valeu muito a pena. Se, até ali, elas se consideravam reféns da vontade sexual do parceiro e faziam "todas as vontades dele", a partir da terapia descobriram não só que seu corpo tem um "potencial infinito de prazer", como chegaram a orgasmos nunca antes alcançados.  "Meu marido não pode saber de jeito nenhum que eu estou aqui", diz a veterinária Lívia, 39 anos, há 12 anos com o mesmo homem. "Nem o meu, pelo amor de Deus", ri a psicanalista Marília, casada há 21 anos, quatro filhos.

As outras duas são a roteirista Camila, 36, separada, sem filhos, e a fisioterapeuta Renata, 40, casada há nove anos, sem filhos. Como não pode estar na entrevista "coletiva", Renata conversou com o blog em outro dia. "O processo (da terapia) foi tão transformador, que depois eu fiz formação em terapia sexual e hoje trabalho com fisioterapia uroginecológica", conta. O marido é o mesmo, mas Renata diz que a transformação a obrigou a pedir um tempo a ele. "Ficamos um ano e três meses separados", diz.

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A fisioterapeuta Renata viu resultados logo na primeira sessão: "Senti uns arrepios, uma excitação diferente. Pensei: 'Opa, funciona!"' (Foto: Arquivo Pessoal)

30 mil orgasmos

Evandro Palma, terapeuta sexual das quatro, é reverenciado por elas como um mago. Aos 52, 11 atuando como terapeuta, ele calcula ter "veiculado 30 mil orgasmos".  Palma fez formação na Sadhana Communa Metamorfose,  autodefinida como um "centro terapêutico de desenvolvimento, pesquisa e expansão da sexualidade humana". Segue um método criado em 1996 pelo coach Tadeu Horta, ou Deva Nishok, que erigiu em Itapeva, Minas Gerais, "o maior espaço dedicado ao tantra do mundo". O Ministério Público de Minas recebeu denúncias de mulheres que teriam sido sexualmente abusadas por Nishok; funcionários o acusam de assédio moral. Ele diz que seu trabalho não é sexual, "é muito sério", e afirma que muitas pessoas deixaram a comunidade irritadas porque ele expulsou voluntários por uso de drogas. Desligado da communa, Evandro Palma hoje comanda o próprio centro, que leva seu nome. 

Ele garante que não há perigo de envolvimento afetivo de ambas as partes, já que "existe uma técnica terapêutica que supõe o distanciamento, a neutralidade". Para afastar qualquer suspeita de segundas intenções, ele descreve a massagem com um linguajar científico: "É um estímulo somatossensorial proprioceptivo, com a ponta dos dedos, de forma leve e lenta. Pode compreender todo o corpo, ou apenas uma parte, de acordo com a anamnese realizada anteriormente. Esse trabalho é completo por si. Mas se for necessário compreender a abordagem da vulva, o estímulo será feito manualmente, com luvas, nos grandes e pequenos lábios, e clitóris — com a aplicação de forma progressiva de uma cápsula vibratória. Isso pode levar a um orgasmo, ou a vários, dependendo do potencial instalado naquele corpo".

Aparentemente, a crença das mulheres no poder transformador da terapia é importantíssima para o êxito do processo. Elas embarcam sem reservas: "Nós não viemos aqui para transar com o Evandro. Não sei como explicar, mas não tem nada a ver com o sexo que a gente faz na vida", acredita Camila. "Você nem sente a presença de um ser humano trabalhando no seu corpo", afirma Renata. Abaixo, trechos das entrevistas com elas. As respostas de Renata estão inseridas no conjunto da conversa, uma vez que as perguntas foram basicamente as mesmas.

Evandro com as pacientes: "É preciso tirar o prazer da imoralidade, legitimá-lo"

Blog — O que as levou a procurar a terapia sexual tântrica?

Lívia — Eu e meu marido fazemos sexo da mesma maneira há 12 anos. Eu é que tenho que ir até ele, mostrar interesse. Se não vou, sou cobrada. No fim, ele espera que eu me masturbe para me satisfazer. Acha que tudo bem assim. Eu, não. Ainda por cima, ele não perde uma oportunidade de me diminuir.

Renata –– Eu tive uma educação repressora, pai italiano, família patriarcal, machista. Sexo era um assunto proibido. Desde o início do casamento, minha sexualidade não se encontrava com a do meu marido, que, por sua vez, é ansioso, não relaxa. Mas aos 26 anos, eu achei que isso seria contornável. Ele se encaixava na concepção doriana que eu tinha de família. Só que, ao longo dos anos, a questão "sexo" começou a pesar. Uma hora, a conta chegou.

Camila — Eu já estava separada, mas sempre me questionei sobre a obrigação que sentia de ser desejável, de performar. Até tive bons relacionamentos, mas sempre achava que era melhor para os caras.

Marilia — Meu caso é um clássico. Estou casada há muitos anos, o relacionamento sexual caiu na mesmice. Se eu trago novidades para a cama, meu marido até topa. Mas sempre tem de partir de mim.

Blog — E como foi a primeira sessão?

Lívia — Nos quinze minutos em que eu fiquei na sala de espera, me vieram as coisas mais loucas na cabeça. Pensava no constrangimento que seria ficar nua, com alguém tocando em mim. Pensei várias vezes em desistir e sair correndo dali. Ainda bem que eu fiquei. Até agora, só fiz duas sessões, mas foi o suficiente para perceber que fiz descobertas incríveis em relação ao potencial sexual do meu corpo.

Camila — No começo, eu me sentia constrangida de ir à terapia. Saía de lá como se estivesse saindo do motel com o cabelo molhado, ao meio dia de uma quarta-feira. Mas das últimas vezes em que fui, eu me senti tão bem, tão desligada, que tive vontade de fazer uma selfie.

Marília — Um divisor de águas na minha vida. Eu não imaginava que meu corpo seria capaz de ir tão longe rs.

Renata — Eu tinha marcado com uma terapeuta, mas me avisaram na última hora que ela não poderia vir. Acabei sendo atendida por um "Shiva" (homem). Ele fez a terapia chamada "sensitive". Consiste em um toque muito delicado, que mexe com a bioeletricidade do corpo. De saída, senti uns arrepios, uma excitação diferente. Pensei: "Opa, funciona".

Blog — E os maridos, como reagiram?

Lívia — O meu não pode nem imaginar que eu estou fazendo, mas percebe que a minha atitude na cama mudou. Está em pânico.

Camila — Eu estou sem namorado. Há um tempo, contei a experiência da terapia tântrica para um cara com quem eu estava saindo, ele ficou tão assustado que terminou o relacionamento rs.

Renata — Eu chamei meu marido para fazer uma terapia de casal comigo (o espaço coordenado por Evandro oferece essa possibilidade), mas em um primeiro momento ele não quis. Quando percebeu que estava surtindo efeito para mim, topou fazer. Na hora em que chegou no lugar e viu do que se tratava, quase teve um ataque do coração. Ficou enciumado, nós brigamos, ele não queria mais que eu fosse. Durante o processo, acabamos nos separando.

Blog — Por quê?

Renata — Eu precisei de um tempo para reavaliar minha vida. A terapia sexual mexeu com tudo, teve impacto até na parte profissional. Hoje, sou fisioterapeuta uroginecológica, trabalho com vaginismo, dor na relação, incontinência urinária.

Blog — Atende homens também?

Renata — Sim. As queixas mais comuns são disfunção erétil, ejaculação precoce, questões que a gente chama de ansiedade por temor do desempenho.

Blog — Eles ficam nus?

Renata — Sim, mas o que eu faço não tem nada a ver com massagem tântrica. Trato o físico enquanto musculatura. Antes, eu converso longamente com o paciente, em um set psicoterpêutico.

Blog — Você chegou a aplicar essa técnica em seu marido?

Andrea — É aquela história do santo de casa. Quando a fisioterapeuta é a mulher do paciente, lascou. Existe uma série de exercícios que ele precisa aprender para fazer em si. É a lição de casa. Mas parece que, quando não se paga, não funciona.

Blog — Na terapia sexual, existe risco de a paciente se apaixonar pelo terapeuta?

Renata — Se eu dissesse que não, estaria mentindo. Mas eu também corro o risco de me apaixonar pelo jornalista ou pelo médico. Não é?

Camila — Imagine! A gente não vem aqui transar com o Evandro. A massagem é um processo que lida com técnicas, em nenhum momento eu estive apaixonada por ele.

Lívia e Marilia — risos

Blog — Vocês atribuem aos maridos grande parte do fracasso sexual do casal. Afirmam que eles esperam que vocês dêem prazer a eles incondicionalmente, e que isso "é cultural, faz parte da educação machista que receberam". Ocorre que, pelo mesmo motivo (cultural), vocês se sentem responsáveis pelo eventual fracasso deles na cama. Não pode existir um homem diferente, que inverta isso, digamos, e se sinta bem dando prazer à mulher?

Lívia — Nunca, de jeito nenhum.

Marilia — Casei com meu marido muito jovem, ele é legal, mas com o tempo o relacionamento foi ficando bem mecânico. Sem contar que agora ele tem 30 quilos a mais.

Camila — Ainda não conheci um homem que me tivesse mostrado as possibilidades infinitas que o meu corpo tem de me dar prazer. Fui descobrir isso na massagem tântrica. No momento, tá tudo certo comigo. Não significa que eu tenha resolvido o problema dos homens.

Renata — Antes de buscar a terapia sexual, fui a vários especialistas. Foi sugestão do meu marido, para saber porque eu estava tão "desestimulada" na cama. Nada funcionou. Uma ginecologista me mandou cuidar bem dele. Quase o levei para ela mesma cuidar. 

Blog — Pelo que eu entendi, o terapeuta leva uma certa "vantagem" sobre os maridos (ou namorados, parceiros sexuais), já que as mulheres vão ao consultório basicamente para ter um orgasmo. Em casa, as exigências são outras. Além de promover um "orgasmo com afeto", é esperado do marido que ele ajude a cuidar das crianças, a administrar a casa, e ainda durma todos os dias na mesma cama. Há um desgaste a ser descontado nesse sexo "doméstico", não? 

Renata —  De fato, a atuação de qualquer terapeuta sexual é muito mais refinada do que a de qualquer pobre marido. Você nem sente a presença de um ser humano trabalhando no seu corpo. Ele sequer nos toca com a roupa. Sim, é desleal exigir do marido que chegue nesse refinamento.

Marília –– Verdade. Ainda mais depois de 21 anos e quatro filhos. Mas também não dá para ficar estagnado.

Lívia —  O desgaste é para ambos. Mas enquanto eu busco entender o que acontece, meu marido não pode nem saber que faço terapia tântrica. Então, mais uma vez, a melhora na cama vai ficar sob minha responsabilidade. Só que, agora, eu sinto que ele vai ter de esforçar mais. Ele também sente rs. Daí o pânico.

Camila —  Bom, eu não estou namorando, então posso dizer que com os eventuais parceiros não existe esse "desgaste doméstico". Mas dá na mesma, viu?  Eu não sei se sou a menina do dedo podre, ou se as frutas é que são podres. O fato é que, se você toca no assunto "sexo", vem aquele papo de macho de esquerda afinado com o feminismo, "não, claro, vamos conversar sim". Mas se você insiste, o cara foge sem deixar rastros.. Eu acho que na relação entre homem/mulher existem muitos vácuos. Eu estou na fila da "cura hétero".

Blog — Vocês falam dos ciúmes do marido, ou que eles sequer podem saber que estão fazendo terapia sexual. Se eles fizessem também, com uma mulher, tudo bem?

Lívia e Marília — Hmm, não. Acho que não gostaria não.

Camila  (que está sozinha) — Acho que tudo bem. É uma terapia gente!

Renata — Eu adoraria. Cheguei a oferecer. As poucas sessões que ele fez fui eu quem deu de presente. Custa R$ 390. Só de receber um presente desse valor, eu estaria feliz da vida. Ainda com a possibilidade de ter um orgasmo e melhorar o entendimento do próprio desempenho sexual, quem não ia querer?

Blog (para Renata) — Apesar dos pesares, vocês reataram o casamento.

Renata — Sim. Um dos relacionamentos que eu tive quando estava separada, o mais duradouro, foi incrível. Serviu, inclusive, para eu descobrir que queria meu marido de volta. Ele é um bom parceiro. Só em respeitar os meus horários de trabalho, eu atendo sábado, domingo, imagine, o cara é um maridão.

Blog — O relacionamento de vocês melhorou?

Renata — Sim. Nossos diálogos estão mais brandos, menos desafiadores, sem cobrança.

Blog — E o sexo?

Renata — Melhorando. Em construção…

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.