{"page-prev":false,"page-next":false,"blogosfera-options":{"category":[{"link":"http://paulosampaio.blogosfera.uol.com.br/category/sem-categoria/","title":"Sem categoria","descriptions":"","slug":"sem-categoria","size":347}],"page-type":"post","blog-id":"172","site-url":"http://paulosampaio.blogosfera.uol.com.br","author-info":{"title":"Sobre o autor","description":"Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para S\u00e3o Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publica\u00e7\u00e3o de mat\u00e9rias de comportamento e entrevistas com artistas, pol\u00edticos, celebridades, atletas e madames."},"blog-info":{"title":"","description":""},"blog-publicity":"","comentarios":{"show":true,"id":14386599,"disableTitle":true,"displayInline":true}},"blog":{"conteudo":{"titulo":"Parte das pacientes considera a anorexia um 'estilo de vida', diz psic\u00f3loga","autor":"Paulo Sampaio","texto":"

A psic\u00f3loga cl\u00ednica Rogeria Taragano,\u00a0supervisora do atendimento ambulatorial em Anorexia Nervosa do\u00a0Hospital das Cl\u00ednicas, falou ao blog sobre a forma\u00e7\u00e3o nas redes sociais de grupos de que fazem apologia dos\u00a0transtornos alimentares\u00a0e chegam a\u00a0estabelecer uma “competi\u00e7\u00e3o doentia pela magreza''. Apesar da possibilidade de interagir na rede, que de certa forma \u00e9 uma novidade, Rog\u00e9ria diz que o perfil da paciente n\u00e3o mudou. Mas em\u00a0fun\u00e7\u00e3o do momento social, segundo a psic\u00f3loga, boa parte delas segue se considerando\u00a0“normal''. “Continuam\u00a0achando que a doen\u00e7a \u00e9 um 'estilo de vida', uma op\u00e7\u00e3o pessoal e n\u00e3o uma condi\u00e7\u00e3o psiqui\u00e1trica, uma doen\u00e7a grave que requer ajuda''. Abaixo, trechos da entrevista com a psic\u00f3loga.

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Duas amigas leais: anorexia e bulimia (Foto: captura de tela)

Blog –\u00a0Antes do advento das redes sociais, a anorexia e a bulimia eram, pelo que se noticiava, vividas de maneira solit\u00e1ria — as pessoas que sofriam de uma das duas (ou de ambas) n\u00e3o faziam a menor quest\u00e3o de divulgar. Era algo que, inclusive, se escondia. O que levou\u00a0essas meninas a mudar o comportamento?

Rog\u00e9ria Taragano — \u00a0O isolamento social \u00e9 uma caracter\u00edstica da doen\u00e7a, ou muitas vezes uma de suas consequ\u00eancias, j\u00e1 que tais pacientes v\u00e3o enfrentando gradativamente cada vez mais problemas para conviver socialmente. Muito do conv\u00edvio social envolve comida, celebra\u00e7\u00e3o… Estas pacientes n\u00e3o gostam de eventos que envolvam comida, isso causa ansiedade para elas. Elas t\u00eam rituais, rotinas alimentares que costumam ser r\u00edgidas, gostam de comer somente o qu\u00ea/quanto consideram que devem e tem medo da observa\u00e7\u00e3o e da perda de controle diante dos outros. Al\u00e9m disso, muitas t\u00eam outros quadros psiqui\u00e1tricos, depress\u00e3o, por exemplo, e isso faz com que queiram ficar cada vez mais em casa, isoladas, sozinhas. V\u00e3o deixando de conviver com amigos, familiares, reduzem as atividades sociais e acad\u00eamicas. O contato atrav\u00e9s das redes sociais passa a ser uma possibilidade de relacionamento com outras \u201ciguais\u201d que dividem as mesmas ideias e dificuldades, e pr\u00e1ticas, muitas vezes na condi\u00e7\u00e3o do anonimato, ou atrav\u00e9s de perfis constru\u00eddos, n\u00e3o necessariamente os verdadeiros. S\u00e3o canais usados principalmente como fonte de troca de pr\u00e1ticas para a perda de peso, m\u00e9todos compensat\u00f3rios para emagrecer. Al\u00e9m disso, algumas das pacientes, por caracter\u00edsticas de personalidade, t\u00eam prazer em exibir seus quadros de desnutri\u00e7\u00e3o, fotos dos corpos muito emagrecidos, al\u00e9m de ter satisfa\u00e7\u00e3o na compara\u00e7\u00e3o com outras pessoas na mesma condi\u00e7\u00e3o. Estabelecem uma competi\u00e7\u00e3o doentia, mesmo que virtual, pela magreza.

Blog –\u00a0\u00c9 mais complicado tratar desses casos agora, que h\u00e1 grupos de meninas anor\u00e9xicas e bul\u00edmicas que se apoiam\u00a0nas redes? Foi preciso criar novas estrat\u00e9gias para lidar com a paciente?

RT – \u00a0N\u00e3o acho que tenha ficado mais dif\u00edcil por causa dos grupos, mas \u00e9 mais uma vari\u00e1vel a ser trabalhada e nesse caso o caminho \u00e9 colocar o tema na pauta das discuss\u00f5es, no trabalho terap\u00eautico tanto individual como grupal. Tratar tais casos sempre foi e continua sendo um desafio em termos de manejo cl\u00ednico. S\u00e3o necess\u00e1rios v\u00e1rios profissionais, de diversas especialidades, apoio familiar e principalmente a vontade do paciente para melhorar. N\u00e3o existe um medicamento que trate o transtorno alimentar diretamente, somente as comorbidades (outras doen\u00e7as psiqui\u00e1tricas associadas). Durante todo tratamento tentamos fazer com que as pacientes deixem de ser \u201cmonotem\u00e1ticas\u201d, ou seja, desenvolvam outros interesses de vida, outros repert\u00f3rios de respostas, de viv\u00eancias, que saiam do foco exclusivo da comida/corpo.

Blog –\u00a0Trata-se de um “novo perfil'' de paciente, ou \u00e9 o mesmo, por\u00e9m com novas possibilidades de express\u00e3o?

RT – Acho que \u00e9 o mesmo perfil, com esta varia\u00e7\u00e3o em fun\u00e7\u00e3o do momento social em que vivemos. Uma boa parte das pacientes se acha \u201cnormal\u201d mesmo quando j\u00e1 muito desnutridas e j\u00e1 apresentando perdas cognitivas, preju\u00edzo pessoal e social, complica\u00e7\u00f5es cl\u00ednicas. Continuam achando que a doen\u00e7a \u00e9 um \u201cestilo de vida\u201d, uma op\u00e7\u00e3o pessoal e n\u00e3o uma condi\u00e7\u00e3o psiqui\u00e1trica, uma doen\u00e7a grave que requer ajuda, tratamento como qualquer outra. Aquelas que ainda conseguem perceber que se trata de uma doen\u00e7a, que preservam este lado saud\u00e1vel que lhes permite entender que elas j\u00e1 foram diferentes e podem voltar a ser, estas costumam ter uma melhor resposta ao tratamento, com uma recupera\u00e7\u00e3o mais r\u00e1pida.

Blog –\u00a0Conversei com uma menina de 16 anos que integra um grupo de 52 correligion\u00e1rias no whatsapp. Ela diz que tem 1,57m de altura e 47 quilos, mas sua meta \u00e9 chegar nos 40. Diz que sempre ouviu que “a gente deve se amar como \u00e9, ent\u00e3o eu me amo assim''.\u00a0 Outra menina\u00a0informa na\u00a0foto grande\u00a0de abertura do perfil que “a melhor forma de vomitar \u00e9 de p\u00e9 e dobrando o tronco para que se forme um \u00e2ngulo de 90 graus entre a boca do est\u00f4mago e as pernas. Isso vai gerar press\u00e3o e fazer o v\u00f4mito sair mais r\u00e1pido''.

RT\u00a0– Para muitas pacientes, infelizmente a \u201cidentidade anor\u00e9xica ou bul\u00edmica\u201d cola, ou cai muito bem. Vem a preencher um espa\u00e7o do ponto de vista pessoal e emocional que ainda n\u00e3o tinha sido preenchido. As quest\u00f5es de baixa autoestima, autocr\u00edtica muito exagerada, perfeccionismo cl\u00ednico, s\u00e3o aspectos que costumam estar na base dos transtornos alimentares. A autoestima tende a estar quase que totalmente amparada na apar\u00eancia f\u00edsica/peso

Blog – Sempre tive dificuldade de conseguir pacientes de anorexia que me dessem entrevistas. Agora, n\u00e3o s\u00f3 me d\u00e3o entrevistas, como falam sem reservas. Pode comentar.

RT – Acho que dar entrevistas, expor as pr\u00e1ticas atrav\u00e9s dos perfis \u00e9 uma maneira de tentar influenciar outras pessoas, buscar seguidores e refor\u00e7ar a pr\u00f3pria cren\u00e7a de que elas est\u00e3o corretas na forma de pensar e agir e que a fam\u00edlia, a equipe de tratamento e a pr\u00f3pria ci\u00eancia, est\u00e3o errados ao classificar o quadro como doen\u00e7a. Mas infelizmente, \u00e9 claro que n\u00e3o se trata de quem est\u00e1 certo ou errado. Elas pr\u00f3prias, durante o tratamento v\u00e3o se conscientizando e se declaram extremamente infelizes, comentam suas perdas pessoais ao longo da doen\u00e7a e o quanto vai ficando muitas vezes extremamente dif\u00edcil sair da condi\u00e7\u00e3o em que entraram. S\u00e3o quadros que trazem muito sofrimento emocional, tanto para os pacientes como para os familiares. Mas \u00e9 importante dizer que uma boa parte destas pacientes consegue se recuperar e voltam a ter uma vida saud\u00e1vel, voltam a trabalhar, estudar, namorar, ter filhos. Quanto mais cedo se inicia o tratamento, melhor o resultado.

Blog –\u00a0Uma vez que essas meninas agora se exp\u00f5em nos aplicativos e\u00a0redes sociais, infere-se\u00a0que\u00a0ficou mais f\u00e1cil para os pais delas conversarem abertamente sobre o assunto. Elas n\u00e3o poderiam negar, como no passado, j\u00e1 que se falam disso abertamente\u00a0na rede?

RT – Teoricamente sim, desde que os pais conhe\u00e7am/tenham acesso ao que publicam os filhos. N\u00e3o \u00e9 o que observo no dia-a-dia. Apesar dessa divulga\u00e7\u00e3o que vc citou, a maioria dos pais demora muito tempo para perceber o problema, muitas vezes quando notam algo procuram profissionais que tamb\u00e9m ainda est\u00e3o pouco acostumados a diagnosticar tais transtornos e muitas vezes passam-se anos at\u00e9 que se fa\u00e7a o diagn\u00f3stico correto para in\u00edcio do tratamento.

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