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Paulo Sampaio

"Parei de brigar na rua quando comecei a lutar na academia", diz Jeiza da vida real

Paulo Sampaio

05/07/2017 04h00

Na vida real, Talita Nogueira é aquilo que a personagem de Paolla Oliveira quer ser na novela das 9 da Globo (A Força do Querer). Campeã brasileira, latino-americana e mundial de jiu-jitsu, Talita ocupa o oitavo lugar no ranking de lutadoras e participa com mesmo empenho de competições de MMA (Mixed Martial Arts).


Talita Nogueira é campeã brasileira, latino-americana e mundial de Jiu-Jitsu

Como diz o nome em inglês, a modalidade mistura várias outras  — jiu jitsu, muay thai, boxe, kikboxing, wrestling, há quem fale em até sete.  Jeiza, interpretada por Paolla, é uma policial que treina MMA para competir –e vencer.  A personagem levou a atriz a suar o top de verdade: "Ela (Paolla) foi muito bem treinada, e você percebe que se dedicou também. O personagem está muito convincente", diz Marcelo Zanin, 45, proprietário da academia onde Talita treina.

Pelo que se depreende nas conversas com especialistas, a maior parte dos praticantes de uma luta, hoje, possui conhecimento de várias outras. Isso possibilita o enfrentamento das diferentes abordagens do adversário (ataque, defesa, solo, em pé).  Talita participou de seis lutas de MMA, obteve seis vitórias. Em agosto, ela embarca para Nova York para participar do evento da Bellator, a segunda maior organização de MMA do mundo, atrás apenas da UFC.  Será a única brasileira entre as participantes. "Vivo da luta. Não só das competições, mas participo de eventos e tenho uma academia na zona leste de SP", diz a campeã, que tem 31 anos e é mãe de uma menina de 13.

No treino, mais de 80% das pessoas que se engalfinham no tatame são homens.  Mesmo que haja mulheres em número par, nada indica que elas vão lutar apenas entre si. Muito menos que os cavalheiros vão preservar as damas nos golpes. Marcelo ri: "Vai lutar mais leve com elas pra você ver. Quem entra aí (na luta), cara, não é besta não", avisa. Marcelo afirma que a luta por si — ainda que exija resistência e força física –, não masculiniza nenhuma mulher. Diz isso com a sensibilidade de quem entende do assunto: "A sapatão pode dançar balé que não adianta."

"Quem entra no tatame, não é besta não", diz o professor Marcelo

No intervalo do treino, Talita conversa com o blog. Ela é esquiva, tímida, monossilábica —  aparentemente, se defende melhor de golpes físicos do que no papo. Com jeito de garotona,  ela ostenta a palavra TRETA tatuada na barriga em letras garrafais e conta que na adolescência tocava o terror.  Sua mãe, enfermeira, não sabia mais o que fazer com a filha que só gostava de brincar com os garotos,  frequentava baladas de rock pauleira e arrumava briga em todo canto. Apanhava e batia com a mesma falta de critério. Consultaram um psicólogo.  Ele sugeriu que ela lutasse em uma academia. Desde então, Talita só bate nas pessoas "tecnicamente". "Sou muito de proteger os indefesos. Então, se eu sentir que alguém está se aproveitando deles, vou defender", diz ela, que não consegue se lembrar de uma ocasião em em teve de usar sua experiência em artes marciais. Sua mãe, que há dois ano morreu de câncer, sempre apreciou a luta domesticada: "Depois que eu me tornei profissional , ela passou a  maior força. Eu virei  outra pessoa, mais tranquila, mais família."

No tatame, o treino alterna movimentos bruscos com abraços prolongados e súbitas paralizações nas posições mais inusitadas.  Faz lembrar as cenas captadas por um cinegrafista do programa Animal Planet. Os lutadores parecem bichinhos exóticos que se enroscam instintivamente para impor seu espaço no habitat em que vivem.

Par namorar, Talita diz que  gosta de homens mais velhos e, de preferência, que frequentem o ambiente da luta. "Vou buscar o rango dela", diz o sergipano Robson Resende, 39, para Marcelo, referindo-se à dieta da namorada. Os dois estão juntos há seis meses. O namorado anterior de Talita  era um desenhista americano de 45 anos, que não lutava. "É difícil para quem não vive 24 horas nesse ambiente entender que a namorada tem de perder 10 quilos. E que, por causa da fome, o humor dela pode variar. Que na véspera de competição ela estará com fome, nervosa e pode chorar de insegurança."

E qual será o rango que espera por Talita? Segundo ela, uma variação qualquer de proteína com brócolis. Frango com brócolis, carne com brócolis, ovo com brócolis.

A pergunta que não quer calar: o que será que ela está achando de Paolla Oliveira na novela? "Não assisto TV. Não tenho tempo."  Tipo finalizando.

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.