Topo

Paulo Sampaio

Usuários do Facebook marcam-se como 'seguros' e causam indignação

Paulo Sampaio

02/05/2018 12h42

O desabamento do prédio no Largo do Paissandu, centro de São Paulo, na madrugada de ontem, levou muitas pessoas que têm perfil no Facebook a se marcarem como "seguros".

Em diversos casos, as marcações causaram um misto de constrangimento e indignação.

Quando alguém se marca como "seguro", quer informar aos familiares e amigos que está tudo bem: que apesar do desastre, nada aconteceu com ele.

Ocorre que, segundo a maioria dos revoltosos, muitas dessas pessoas "nem sabem onde fica o Largo do Paissandu". Querem apenas "chamar a atenção pra si, sem dar nenhuma colaboração concreta aos desabrigados".

Broncas e ironias

Em resposta às marcações, há desde broncas até ironias.

"Por que, em vez de querer querer aparecer e informar sobre um risco que elas nem correram, essas pessoas não se oferecem para ajudar as vítimas?"

"O que passa pela cabeça desse povo? Por acaso eles sabem o que é uma ocupação? Já estiveram em alguma?"

"Tá feio.."

#Vdevexame"

Vocês moravam no prédio?

O publicitário Julio Bedin, 42 anos, de Curitiba, perguntou aos amigos — "entre eles pessoas queridas"— porque eles estavam se marcando: "Vocês moravam no prédio?" O resultado foi um bate-boca entre os que concordavam com a perplexidade dele e os que não. "Fiquei um pouco chocado de ver pessoas que, em uma situação tão delicada,  'inutilizavam' a generosidade. Não dá para apertar o botão (da marcação) como se fosse um novo brinquedinho. Não é selfie, gente."

Ele conta que a discussão paralela, cada vez mais distante da tragédia em si, o levou a retirar o post do perfil. "Quando vi que não estavam entendendo a mensagem, apaguei."

As justificativas (outro lado)

Como justificativa, alguns dos que se marcaram informavam que não são de São Paulo e que suas famílias e amigos que moram no interior ou em outros estados poderiam estar preocupadas. O mais comum era publicarem posts como: "Minha mãe não sabe se o Largo do Paissandu é ao lado da minha casa".

Ou: "Eu já morei a menos de 300 metros do prédio".

E ainda houve os que reagiram agressivamente: "Pior é você que acha que entende de ocupação mais do que ninguém! Vai morar lá então!"

Em certos casos, a impressão era a de que o usuário não sabia ao certo para que serve a marcação. O maestro de modelos Ciro Álvaro de Faria, 60 anos, que mora no litoral norte de São Paulo, explica que se marcou porque ficou "muito triste com o acontecimento". "Pessoas sem ter onde morar, que são obrigadas a invadir um local com problemas de estrutura. E ainda tinham de pagar aluguel. Esse país está realmente sem liderança e organização. Não vejo saída para o Brasil. Somente se houver uma grande manifestação e todos se recusarem a votar. Gratidão."

Até agora, há uma vítima confirmada — um homem, que estava sendo resgatado quando o prédio desabou. De acordo com o Corpo de Bombeiros, até o meio da manhã havia pelo menos 49 pessoas desaparecidas. Alguns dos 428 desabrigados dormiram esta noite na calçada da igreja Nossa Senhora do Rosário, que fica no Largo do Paissandu.

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.