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Paulo Sampaio

Galvão Bueno vende emoção em curso de vinho para comunidade na periferia de São Paulo

Paulo Sampaio

08/05/2017 12h08

Uma grande movimentação tomou conta da ONG Gerando Falcões, que atende 800 crianças carentes de uma comunidade de Poá, município a 34 km de São Paulo. Aguardava-se a chegada do jornalista Galvão Bueno, que inauguraria no sábado (6) um curso de sommelier patrocinado por sua vinícola, a Bueno Wines. Sommelier é o termo em francês para designar o profissional que sabe diferenciar vinhos, comprar, armazenar, harmonizar e é também quem monta o cardápio de bebidas em um restaurante.

O empreendedor social Eduardo Lyra, 29, que criou a ONG há quatro anos, não encontrava palavras para agradecer seu ídolo. Criado apenas pela mãe, com o pai preso por envolvimento com o crime, lembrou: "Quando eu era criança, na noite das quartas-feiras, não tinha fome, não tinha frio, não tinha tráfico. Tinha o Galvão narrando o futebol na TV."

A placa com o símbolo da ONG Gerando Falcões e da Bueno Wines (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Maior narrador do mundo

Bueno parecia muito tocado. Ao visitar as dependências da escola municipal José Antônio Bortolozzo, onde a ONG promove atividades ligadas a cultura, esporte e qualificação profissional, ele arrastou uma pequena multidão atrás de si. Passou a mão na cabeça das crianças, mostrou-se incansável posando para fotos com elas e fez comentários alentadores na sala de artes, onde diversos alunos pintavam telas de paisagens. Na sequência, na quadra poliesportiva, disse que tinha sido jogador de basquete, tirou mais fotos e então seguiu para homenagens com números de dança e canto, tudo devidamente filmado. O cinegrafista disse a um menino que a gravação iria ao ar durante a semana, no Globo Esporte. O menino pulou: "O Galvão Bueno é o maior narrador do mundo!"

Selfie com o coral ao fundo (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Depois da apresentação de um coral de 130 crianças, Bueno sentou-se com todos no palco: "Eu trabalho com emoções, eu vendo emoções, é o meu produto. E agora, observando essas telas pintadas por essas crianças, ouvindo esse coral, minha nossa, eu já assisti a muitas apresentações de coral na vida, mas esse é o mais bonito que eu já vi", disse, seguido por palmas.

Alunos de boxe da ONG (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Muito familiar

Além dos familiares de Lyra, estavam presentes os do próprio Galvão Bueno. Sua filha, sua neta e sua mãe. Ele contou que esta última é uma grande batalhadora, cuida de uma entidade sem fins lucrativos que oferece tratamentos médicos a comunidades carentes de Londrina (PR): "88 anos!", exclamou Bueno, dando a palavra a ela.  "Mãe, eu queria agradecer muito, muito a senhora por poder estar aqui."

A pauta seguinte foi cidadania: "O que eu vejo aqui é uma escola de formação do cidadão. A ética não é mérito, é obrigação. O que a gente vê hoje na classe política, essa vergonha, isso é o pior exemplo que um país pode ter."

Galvão Bueno fala na sala do curso de sommelier (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

A certa altura, alguém tem a ideia de chamar os professores do curso de sommelier, para explicar como será. Os irmãos Alex, 33, e Rodrigo Pimenta, 31, dizem que há 12 inscritos e que serão 12 aulas. Incluem leitura de rótulo, história, produção, vinificação, harmonização e serviço: o cuidado com cada vinho e como servi-los.

Em defesa das mulheres

Bueno emenda com um defesa de gênero: "Estaríamos muito felizes se metade dos inscritos fossem mulheres. E não é que há 9, entre 12…" Palmas! O dono da vinícola diz que os dois alunos que tiverem melhor desempenho já tem um "excelente emprego". Um no restaurante Vinheria Percussi, outro na Bueno Wines. Palmas. Alex e Rodrigo tiram fotos com o criador da ONG e com o jornalista e então…

… de repente, Bueno aponta para um quadro de Nelson Mandela pendurado na parede: "Eu tive com aquele cara ali. Um exemplo para o mundo.Você pode se aproximar da estátua: mas se aproximar dele é uma experiência que um ser humano jamais esquece."

Ele associa Mandela ao confronto político no Brasil. "Vivemos uma época muito difícil, os políticos nos envergonham, e não tem esse ou aquele partido. São todos. O que me preocupa, justamente, é o confronto. Será que é por aí? Será que a gente não pode ter uma opinião diferente do outro sem ter de partir para o ataque?"

Silêncio na sala.

"Esse homem (Mandela) passou décadas na cadeia. Esse homem não tinha um colchão para se deitar, um pano para ajudá-lo no frio. Esse homem foi torturado mental e fisicamente. Esse homem saiu da prisão sem ódio. Esse homem se elegeu presidente da República…" Palmas continuadas! "Por que a divergência de ideias tem de levar ao confronto? Será que não é possível resolver no diálogo? É possível, sim,  Mandela nos mostrou!"

Direita ou branco

E Lyra: "Quando chamei o Galvão para participar do projeto, ele não me perguntou se eu era de esquerda ou direita, negro ou branco…" Galvão levanta os braços e as sobrancelhas, num gesto silencioso que quer dizer "claro que não". Palmas!

Com os sommeliers Alex e Rodrigo; Eduardo Lyra; Letícia, a filha (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

Abrem-se as garrafas, fazem-se brindes. E fotos, fotos, fotos. Galvão é acompanhado pelo segurança até o carrão preto que o trouxe, dá até logo e parte.

 

 

Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.