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'Já me ofereceram mala de dinheiro por uma transa', conta ex-símbolo sexual

Paulo Sampaio

29/01/2019 05h00

No inverno de 1986, quando voltava de um trabalho em Goiânia, a modelo  fluminense Magda Cotrofe sofreu uma picada na nádega esquerda que quase a obrigou a amputar a perna. "O avião era fretado, tipo pequeno, e até hoje eu não sei que inseto me mordeu naquela poltrona. Só me lembro que a coisa comeu minha carne por dentro, infeccionou, e eu tive de passar por uma cirurgia", conta ela, hoje com 56 anos.

Por causa da infecção, Magda precisou parar de fazer atividade física, o que ocasionou um efeito colateral que no fim se revelou positivo: "Eu inchei, mas as pessoas tinham a impressão de que eu estava mais gostosa", lembra. O resultado foi aferido cinco meses depois, quando ela apareceu pela segunda vez na capa da revista "Playboy". "Foi um estouro. Eu não podia nem sair de casa. Virei uma celebridade", ri.

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Na capa da Playboy de dezembro de 1986, quando ainda se recuperava de uma picada de inseto na nádega esquerda: "Eu inchei, mas passava a impressão de estar mais gostosa" (Foto: Arquivo Pessoal)

Proposta recusável

Para atrair visibilidade e conseguir trabalhos como modelo comercial, que era o que dava dinheiro, Magda precisava se expor não só em capas de revistas "masculinas" — como eram chamadas publicações como "Playboy" e "Ele & Ela" –, mas também em júris de programas de auditório, em bailes de Carnaval e na própria Marquês de Sapucaí. Ela tinha de estar onde houvesse "olheiros" atrás de rostos vendáveis.

Na ocasião, outros insetos tentaram morder suas nádegas, mas ela conta que foi igualmente firme ao extirpá-los: "Numa dessas viagens ao interiorzão do Brasil, teve um homem que apareceu com uma mala na porta do meu quarto no hotel, olhou pra mim e disse: 'Está cheia de dinheiro. Quanto você cobra?' Antes que eu batesse a porta na cara dele, ainda deu para ouvi-lo repetir, com indignação, 'Mas é dinheiro!', como se a proposta fosse irrecusável."

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Recados nojentos

Como as feministas da época não faziam o barulho que se ouve hoje, muitos homens se sentiam à vontade para abordar, sem meias palavras, mulheres que posavam nuas. "Você não imagina os recados nojentos que deixavam na secretária eletrônica da minha casa. Mas eu ligava de volta e descascava."

Quem administrava a carreira de Magda Cotrofe era a própria. Nos desfiles, a produção também era dela. "De repente, eu entrava na passarela coberta por uma capa, com luvas, óculos escuros, e então abria os braços e mostrava a roupa da coleção. Nos anos 80, tudo era over. A Xuxa abria espacate na passarela. O perigo dessa autonomia era não saber o limite do bom gosto. Se a modelo fosse cafona, acabava  comprometendo a imagem da marca."

Propaganda da loja Boutique Festa, que sempre a vestia no Carnaval (Foto: Arquivo Pessoal)

Penelope charmosa

Ela acha engraçado quando alguém comenta que uma aspirante a modelo ou atriz, hoje, precisa contratar um especialista em "construção de imagem", outro em "mídias sociais" e um "assessor de imprensa". "Eu mesma construía a minha imagem. Aprendi a andar de moto, por exemplo, para me destacar. Comprei um modelo Trail e só andava com ela pela cidade. Um sucesso."

Não havia nenhuma estrutura para blindar a moça de 19 anos contra previsíveis ciladas.  "Era tudo muito amador. Sabe o teste do sofá? Acontecia demais. Uma vez, um sujeito me chamou para participar da seleção para um comercial e, quando cheguei lá, só tinha eu. Era uma salinha na Visconde de Pirajá (principal via de Ipanema). Eu entrei, ele começou: 'Senta pra gente conversar…'. Eu era bem grossa nessas horas. Disse: 'Tá pensando que eu não tenho mais nada pra fazer! Vai chamar a sua mãe pra fazer comercial.."'

Nudez colunável

Por outro lado, uma mulher notoriamente desejada podia virar socialite da noite para o dia. Socialite, naquela época, era um personagem que tinha peso de celebridade.  Em um tempo em que o Rio ainda ditava comportamento, a foto de uma moça que era capa da Playboy aparecia na coluna social mais lida da cidade, ao lado de figuras como Carmem Mayrink Veiga, Regina Marcondes Ferraz e Kiki Garavaglia. "Eu saía o tempo todo no Zózimo (Barrozo do Amaral)", lembra ela, referindo-se ao colunista do finado Jornal do Brasil, um dos quatro mais respeitados do país naquele tempo.

Estar na exclusivíssima página 3 do caderno B do jornal agregava muito valor ao cachê de uma modelo comercial. Especialmente quando ela era assediada pelo solteiro mais cobiçado do momento, Antenor Mayrink Veiga, filho justamente de Carmem. "Eu cheguei a sair com o Antenor, mas aquela mãe dele regulava todas que se aproximavam do filho, não dava", conta Magda, sem dar muito valor à conquista, apenas como fato pitoresco.

Uma grande paixão

Conterrânea dos imperscrutáveis Rosinha e Anthony Garotinho, Magda Cotrofe nasceu em Campos dos Goytacazes, no norte do estado do Rio, em janeiro de 1963. Filha mais nova de quatro irmãos, pai técnico em eletrônica, mãe dona de casa, ela se apaixonou por um par de patins Bandeirantes ("aquele que você colocava por cima do tênis") ainda aos 14. Virou professora no Automóvel Clube local ("dava aula para 100 alunas de todas as idades"), depois atleta federada, e então mudou-se para o Rio com a mãe, disposta a competir pelo Flamengo.

Aos 14 anos, feliz da vida sobre patins, em Campos de Goytacazes (Foto: Arquivo Pessoal)

Chegou a substituir a campeã sul-americana Michele Wollens, mulher do jogador de vôlei Bernard "saque jornada nas estrelas" Rajzman, em uma apresentação solo, mas então o Flamengo descontinuou a patinação artística de sua grade de modalidades esportivas. (A título de curiosidade, Bernard integrava a seleção em que jogava Renan, outro peguete de Magda. "Sim, eu namorei bastante.")

Musa do fio dental

Um dia, ela se casou. Não sabe explicar por que escolheu, entre tantos partidos supostamente principescos, um homem que não era lindo, milionário ou mesmo colunável. "Eu acho que eu estava me sentindo sozinha, insegura. Você tem uma porção de homens te bajulando, e ao mesmo tempo não tem nenhum. Aí, você casa." Com o empresário Rob Magalhães, teve os dois filhos, Thalita e Thiago, hoje na casa dos 20 anos, e fez uma parceria rentável na marca de moda praia Ki Tanga.

Ela se orgulha de ser usuária precursora do modelo fio dental, que, não é nada, não é nada, figura no museu do biquíni na Alemanha. Há várias fotos dela em editoriais de moda de revistas como "Nova", da Abril, e "Desfile", da Bloch, vestindo outro lendário modelo, o asa delta, cujas laterais eram suspensas até acima do osso do quadril.

No auge da fama, em uma edição da concorrida Fenit (Feira Nacional da Indústria Têxtil), "o povo quase derrubou o stand quando soube que eu estava lá dentro". Assistindo ao avanço siderado dos fãs estava um empresário conhecido como Cidinho da Bumbum, que vinha a ser uma marca de moda praia. "Naquele dia, ele me convidou para fazer o lançamento da Bumbum em Ibiza." Muito merecidamente, Magda virou a cara da Bumbum.

Três momentos: catálogo da grife de lingerie Du Loren 1984/85 (esquerda); e dois editoriais de moda na revista "Nova", também na década de 1980 (Fotos: Arquivo Pessoal)

Brotinho de patins

Entre os patins e o casamento, Magda participou de vários dos muitos concursos de beleza que se promoviam na época. Garota Verão, Garota do Fantástico, garota isso, garota aquilo — mas sempre ficava em segundo ou terceiro lugar. "No primeiro concurso, promovido pelo programa do Silvio Santos na TVS, os jurados diziam: 'Plástica perfeita, mas não tem altura"',  lembra ela, que mede 1,67m.

Aos 18 anos, posou para a seção "Brotinho da Ele & Ela", uma versão adolescente das "revistas masculinas", abraçando os seios nus. Logo virou destaque da escola de samba União da Ilha, e então a chamaram para fazer "Playboy": "Recusei da primeira vez, porque eu ainda tinha cabeça de moça do interior, era arisca."

Mas depois foi capa três vezes, em 1985, 1986 e 1987, "porque aquilo rendia muito profissionalmente": "Eu era fominha mesmo, pensava no dinheiro. Viajava muito, trabalhando sem parar. Não tinha tempo nem para deixar a mala de roupa usada em casa. Pedia à moça que fazia a limpeza para levar a outra mala, com roupa limpa, até o aeroporto. Descia de um voo, já entrava em outro. "

Viva o Gordo

E então, de comercial em comercial, ela foi parar na TV. Participou de vários humorísticos da linha de shows da TV Globo, entre eles "Viva o Gordo", "Chico City"e "Os Trapalhões". Fazia, digamos, apoio para os comediantes. Aparecia de biquíni, sorridente e, exceto por algumas interjeições, entrava muda e saía calada.

Conta que sofreu preconceito por ser o que, na época, chamavam de "mulher objeto" : "Mas eu não estava nem aí, não tinha tempo para pensar naquilo." Enfrentou cara feia na família também: quando posou nua pela primeira vez, seu pai perguntou: "Tá passando fome?" Os dois ficaram sem se falar um bom tempo, mas os elogios à beleza dela eram tantos e tão rasgados, que ele passou do ressentimento ao orgulho. "Ele adorava né?"

Com Jô Soares, no quadro do Zezinho do "Viva o Gordo" (Foto: Arquivo Pessoal)

Mau negócio

Em 2000, separada do primeiro marido, Magda se juntou ao personal trainer Sergio Ferrari, 10 anos mais novo que ela. Os dois chegaram a se casar, em 2010, com uma festança, mas ela conta que os ciúmes do marido a levaram a perder muitas oportunidades profissionais. "Eu estava no auge quando o conheci, no 'Zorra Total', fazendo muitos comerciais. Aos poucos, fui largando tudo, me afastando da publicidade, e quando vi estava a beira de uma depressão", lembra. Ela diz que não pode contar os "detalhes sórdidos" da separação, que aconteceu no ano passado, porque o processo corre em segredo de Justiça. "Você não pode imaginar a que ponto chegou", diz, negando-se a revelar do que se trata.

Houve a tentativa de emplacar uma grife de joias com o seu nome, mas o negócio não foi adiante. Quase sem nenhuma maquiagem, ela diz que "poderia ser mais vaidosa". Afirma que não fez plástica no rosto, apenas aplica Botox e colocou próteses de silicone nos seios. Frequenta academia, está com o corpo em dia e cuida da alimentação. Cursou jornalismo e diz que sonha participar de um programa de variedades na TV.  "Nunca quis ser atriz, como muitas modelos, mas a ideia de fazer um programa de entrevistas na TV me atrai." Alô, produção!

No Leblon, Rio, depois da entrevista (Foto: Paulo Sampaio/UOL)

 

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Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.