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Crimes contra mulheres na internet sobem 30% em 2018, segundo polícia do PR

Paulo Sampaio

23/02/2019 05h00

 

(Foto: iStock)

Depois de cinco meses de uma sólida amizade no facebook, a empresária Rita C., 48 anos, nem pensou em duvidar do homem que havia se apresentado a ela como Mario e que agora contava que seu escritório fora atingido por um incêndio de grandes proporções e que não sabia como fazer para cobrir o prejuízo. Nas frases tecladas por Mario com rapidez, muitas palavras apareciam com letras a mais, ou a menos, o que dava a entender que ele estava "realmente desesperado".

Tomada de misericórdia, Rita se propôs a ajudá-lo financeiramente. Ele resistiu: "Não, de jeito nenhum, imagine! Isso é um problema meu, eu tenho que resolver. Aliás, eu é que estou te devendo um convite para jantar, mas agora te peço que espere um tempo até que eu possa me recuperar desse baque." Dois dias depois, sob orientação do próprio Mario, Rita transferiu R$ 29.900 para contas definidas por ele.

Ela não viu mais a cor do dinheiro — Mario sumiu no mundo.

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Rita registrou a ocorrência no Núcleo de Combate ao Cibercrime do Paraná (Nuciber), pioneiro na apuração de delitos no ambiente da internet. Criado em 2005 pela Polícia Civil, o Nuciber já acompanhou cerca de 250 mil casos. No último ano, registrou um aumento de 30% no número de crimes contra mulheres. Desde 2015, foram 61 boletins de ocorrência. "Boa parte das vítimas são viúvas, ou mulheres que enfrentam perdas de entes queridos, ou ainda que atravessam crises de depressão. Esses golpistas se aproveitam da vulnerabilidade delas para oferecerem um 'ombro amigo"', diz o delegado-chefe do Nuciber, Demetrius Gonzaga de Oliveira. Ele lembra que o número de boletins de ocorrência é subnotificado, já que muitas vítimas não fazem o registro, por vergonha.

Forma de pagamento

Ao aceitar a ajuda da amante virtual, o criminoso em geral dispõe de: 1) uma conta autêntica; 2) uma aberta com documentos falsificados; 3) ou em nome de laranjas. Alguns golpistas de origem estrangeira pedem à vítima para fazer a transferência via Western Union, multinacional que oferece serviço de envio de dinheiro para o exterior.

Em um dos casos relatados por Oliveira, um suposto "soldado inglês" conseguiu que uma mulher solteira de 58 anos fizesse três depósitos que somavam quase R$ 25 mil, nos valores de R$ 4.200; R$ 8.200; e R$ 12 mil. O tal soldado atraiu a mulher com um perfil falso, cuja foto ilustrativa havia sido capturada em um site de relacionamentos internacional.

De acordo com o delegado, ainda que o golpista forneça o número de uma conta autêntica e seja relativamente fácil identificá-lo, não é tão simples provar que ele de fato é um estelionatário: "O sujeito pode alegar que a mulher enviou o dinheiro por vontade própria, que ela não foi coagida e, se bobear, ainda joga na cara que está sendo difamado. Imputa a vítima de desequilibrada e manda que ela procure os seus direitos." Só pelo estelionato, o golpista pode pegar  de 1 a 5 anos de prisão. Se houver outros crimes, a pena aumenta.

O estado emocional das mulheres que registram boletins de ocorrência vai da tristeza profunda ao ódio figadal. A maioria chega à delegacia inconformada, querendo punição máxima. Oliveira diz que o registro da ocorrência é muito importante. "O ideal é que todas as vítimas nos procurassem. Isso nos ajudaria muito a rastrear criminosos. Até porque muitos aplicam golpes em série."

Por ordem de gravidade

Segundo o delegado, casos como o da paisagista carioca Elaine Caparróz, brutalmente agredida na segunda-feira pelo estudante Vinicius Serra, que ela conheceu no instagram, podem ou não ser tipificados como cibercrimes: "Apesar de os dois terem se conhecido no ambiente da internet, e de ele tê-la enganado por oito meses, o crime mais grave foi o espancamento. Mesmo que ele tivesse cometido estelionato, ou incorrido em falsidade ideológica, a agressão física se sobrepõe em gravidade. Então, o caso é encaminhado à delegacia de crimes contra a pessoa."

No caso mais recente apurado pelo Nuciber, os envolvidos haviam se conhecido em um site de namoro. Dois meses depois, o sujeito disse à mulher que estava detido na aduana do aeroporto do Galeão, com um diamante que havia trazido para ela. Precisava pagar uma fiança para ser liberado. "Há casos de estrangeiros querem ter uma ligação legal com a mulher, porque têm interesse entrar e sair do Brasil na hora que bem entendem", explica o delegado.

Para Oliveira, a legislação no Brasil deveria ser mais rígida em relação a internet. "Qualquer um pode comprar um chip em banca de jornal, sem necessidade de identificação. Você vê promoções de internet aberta nos aeroportos, em praças, lugares públicos. Daqui a pouco vão liberar também no Sanbódromo", indigna-se Oliveira. "Isso dificulta muito o trabalho de quem lida com segurança."

 

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Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.