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Voto no Bolsonaro, diz palestrante em evento do Lide, criado por João Doria

Paulo Sampaio

25/04/2018 15h11

A jornalista Joice Hasselmann se apresenta como "a maior influenciadora política do Brasil". E declara: "Voto no Bolsonaro." Joice foi uma das duas palestrantes do seminário "Perspectivas de Mercado para 2018", que o grupo Lide Mulher promoveu anteontem em um espaço chamado SB Coaching, na Vila Olímpia, zona oeste de São Paulo.

Fundado em 2003 pelo candidato tucano ao governo de São Paulo, João Doria Jr., o Lide (Grupo de Líderes Empresariais) reúne 1700 empresas, ou, segundo divulga, mais de 50% do PIB nacional. A atual presidente do Lide Mulher, Nadir Moreno, 49 anos, garante que o grupo é "apolítico".

Joice Hasselmann, "a maior influenciadora política do Brasil", em plena palestra (Foto: Carine Wallauer/UOL)

Conversa Fiada

Candidato do PSL à Presidência da República, Jair Bolsonaro tornou-se conhecido por ser  ultraconservador, nacionalista e defensor da ditadura militar. Já afirmou que considera a tortura uma prática legítima e assume posições contrárias à defesa dos direitos da comunidade LGBT.

"Conversa fiada", garante Joice. "Isso tudo é história. Você conhece o Bolsonaro?"  Loura, grande e opulenta, ela usa um vestido de veludo preto com bordados no decote e sapatos de saltos muito altos. Depois de dizer que possui  "a maior página de política do Brasil e o maior canal de Youtube", a influenciadora explica que "na época da ditadura, você tinha a repressão militar de um lado, e o grupo dos comunistas, do qual a Dilma fazia parte, do outro. Eles eram terroristas, sequestravam e torturavam pessoas".

Brasileiro não sabe votar

Joice afirma que tem seguidores de todos os "extratos sociais". "Hoje eu oriento pessoas das classes A, B, C e já pego um pedacinho da D. O brasileiro não sabe votar. Não tem ideia."

Para provar o que diz, ela propõe um "teste de sincericídio" à audiência, integrada em sua maioria por eleitoras da classe A. "Quem aqui sabe que na eleição deste ano nós teremos de escolher dois senadores?" Ninguém levanta a mão. Ela sugere que acessem sua página e seu canal, para, quem sabe, votar em Bolsonaro.

Seminário atípico

Nadir Moreno explica que o seminário foi atípico, "porque é ano de eleição". "A ideia é chamar a atenção do povo, dar uma chacoalhada!"

Ela é presidente da multinacional de logística UPS (United Parcel Service), "que tem 454 mil funcionários em todo o mundo", e por isso diz que não pode declarar seu voto para presidente: "Eu represento a empresa, não sou dona", explica.

Supõe-se que votou em João Dória Jr. para prefeito…? Resposta neutra: "E quem não votou?"

A presidente do Lide Mulher, Neide Moreno (Foto: Carine Wallauer/UOL)

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Exemplos a ser seguidos

A vice-presidente executiva do Grupo Dória e do Lide, Celia Pompeia, explica que sempre convida para fazer as palestras  "mulheres que são exemplos a ser seguidos".

A segunda palestrante, Denise Santos, da Beneficência Portuguesa, fala dos absurdos cometidos na saúde pública e das histórias de superação no setor privado. Comenta os resultados positivos de sua gestão, cita números astronômicos, e mostra seu empenho para se aproximar dos funcionários da empresa. Lembra do dia em que ela entrou no elevador e foi abordada por um pintor da área de manutenção:

"A senhora não é a Denise Santos?"

"É…sim, sou."

"Eu quero que a senhora me demita."(risos gerais na plateia do seminário)

"Mas por quê? Eu não posso fazer isso!"

"Eu trabalho aqui há 30 anos, preciso do dinheiro."

Denise então conta que chamou o funcionário para sair do elevador, o convidou para um café no refeitório e, depois de uma conversa, disse a ele: "A decisão é sua, não minha." Para a plateia, ela arremata orgulhosamente o fim da história: "Ele está lá até hoje." Denise, que tem cabelos curtos, usa paletó azul marinho e mocassins escuros de salto baixo, diz que o que tem dado certo em sua gestão é chegar o mais próximo possível de seus funcionários. "É preciso orientar esse cidadão. Cada voto é muito importante", diz ela, com um ar dadivoso.

Valentino apertado

Antes de o seminário começar, as participantes confraternizaram no saguão. "É Valentino, mas está acabando com o meu pé", diz a empresária Carolina Santoro, 36, rindo muito, enquanto responde qual a marca do sapato vermelho de bico fino, cravejado de spikes, que está usando. "Passei na Drogasil e comprei esse band-aid grande (aponta a lateral da sola) para aguentar."

Carolina, que usa um longo colar de pérolas Chanel e carrega uma bolsa grande Yves Saint Laurent, é uma das mais divertidas participantes do evento. Ela foi com a irmã, Mariana Batochio, 43, com quem administra o escritório Sodré Santoro Leilões, que as duas herdaram do pai. "Promovemos leilões de tudo, menos de animais e arte", diz Mariana. O forte delas são os carros: "Temos 17 mil no pátio. Casos de retomada, de furto, perda total… Vale muito a pena (arrematar), sai por um valor 25% mais em conta que a tabela Fipe", explicam elas.

Muito entusiasmada, a dupla lembra de que precisa trocar cartões de visita. "Vamos esvaziar a caixinha. Papai disse que é para fazer networking", diz Carolina. Antes de trabalhar na empresa do pai, ela quis ser atriz e chegou a fazer o curso Celia Helena de teatro: "Desisti por causa dos egos dos atores. É um ambiente muito carregado."

As irmãs Santoro, Carolina e Mariana, em pausa no networking (Foto: Carine Wallauer/UOL)

Sergio Moro

No auditório, a produção projeta em uma tela o anúncio do evento Personal of The Year, promovido pela Brazilian American Chamber of Commerce, que todo ano elege um homem de destaque nos EUA, e um no Brasil. Os deste ano são o ex-prefeito de Nova York Michael Bloomberg e o juiz Sergio Moro, que recebem a homenagem no dia 16 de maio. João Dória foi o do ano passado, junto com o governador da Flórida. "A gente aproveita a semana agitada em Nova York para promover um café da manhã, no dia seguinte ao da festa deles, no hotel The Pierre. É bárbaro!", diz Celia Pompeia.

…Uma loura magra levanta na plateia, põe a mão no alto da cabeça e reclama do ar condicionado. As recepcionistas trocam-na de lugar. Com sua Fendi, ela é transferida para a última fileira, onde passa a teclar no celular completamente alheia às palestras das influenciadoras.

Versace, sem querer

Loura, chamativa, usando peças Versace da cabeça aos pés ("não foi de propósito"), a empresária Cláudia Martinez, 42 anos, chega cerca de 20 minutos depois do começo do seminário e desce o corredor central do auditório em busca de um lugar para sentar-se. O blog vai ao seu encontro. Ela conta que durante 25 anos trabalhou em todas as posições no mercado financeiro. Hoje, é casada com um banqueiro 20 anos mais velho. "Durante todos esses anos, eu era a minoria da minoria. Nas instituições financeiras, mulher fica na recepção", diz, rindo.

Apesar de ter pulado essa etapa, Cláudia não gosta do termo "empoderamento". "Não sou nada feminista, acho a discussão de gênero ultrapassada. Pra mim, desvaloriza a participação da mulher na sociedade.  Tudo no trabalho, para homens e mulheres, está ligado a competência, a direitos e obrigações."

Sobre o seminário, Cláudia diz: "Mulheres podem até encher o saco, mas quando abrem a boca é para dizer algo que não se espera. Ninguém dá conselho melhor que mulher."

Claudia Martinez, que não gosta de termos como "empoderamento", foi de Versace da cabeça aos pés (Foto: Carine Wallauer/UOL)

Profissional da diversidade

Única negra entre as cerca de 100 líderes presentes, Flávia Martins, 39 anos, conta que integra um grupo de diversidade dentro da empresa em que trabalha, a TransUnion, de informação de dados e tomada de decisão de crédito. "Acompanho o movimento (da diversidade) há muito tempo. Estou acostumada a ser a única nos ambientes. Na escola já era, depois na pós graduação, nos restaurantes." Muito segura de seus atributos, ela afirma que foi "literalmente caçada" na empresa onde trabalhava anteriormente, por ser um exemplo de profissionalismo e diversidade. "Falo quatro idiomas, ajudei a criar meus irmãos por parte de mãe e sempre fiz tudo para desempenhar o melhor possível o meu trabalho."

Flávia Martins, única negra entre as cerca de 100 mulheres presentes; exemplo de profissionalismo e diversidade (Foto: Carine Wallauer/UOL)

Alguma pergunta?

Quando as palestrantes acabam de falar, Nadir Moreno, que tem o cabelo muito liso e louro, pele cor de terracota e dentes grandes e alvos, se dirige à plateia: "Agora, quem tiver alguma pergunta pode levantar o braço…" Nada. Começa a debandada. Umas 20 mulheres batem em retirada quase ao mesmo tempo. Em pouco mais de uma hora, a conversa termina.

À saída, cada convidada ganha duas sacolas com brindes dos patrocinadores. Entre eles, três detergentes. Significa.

 

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Sobre o autor

Nascido no Rio de Janeiro em 1963, Paulo Sampaio mudou-se para São Paulo aos 23 anos, trabalhou nos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, nas revistas Elle, Veja, J.P e Poder. Durante os 15 anos em que trabalhou na Folha, tornou-se especialista em cobertura social, com a publicação de matérias de comportamento e entrevistas com artistas, políticos, celebridades, atletas e madames.